Susan Souza
Letras sobre sexo fazem parte de músicas de artistas como MC Pedrinho, de 12 anos, e MC Livinho, 19; Leia entrevistasParte dos MCs de funk de São Paulo estão aderindo a rimas picantes que dialogam com o trabalho de muitos funkeiros de proibidão do Rio de Janeiro, como Mr. Catra e MC Magrinho. Nessa linhagem do funk, as letras falam abertamente sobre sexo com palavreado direto, motivo pelo qual são consideradas pesadas pelos próprios MCs.
MC Livinho
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MC Brisola
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MC Pedrinho
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"Tem menina, menino e até adulto que fala (críticas), fica postando que 'eu não tenho nem tamanho', falando vários negócios. Tendo progresso e ajudando as pessoas que sempre me apoiaram, eu me sinto melhor. Não vou ligar para quem não está comigo", diz ao iG o MC Pedrinho, de apenas 12 anos.
"Não posso falar que todo mundo na escola adora"
Pedrinho mora na zona norte de São Paulo, mas estava no Rio de Grande do Sul para alguns shows quando atendeu à reportagem. Atualmente matriculado em uma escola particular, Pedrinho ficou conhecido, aos 11 anos, por "Dom Dom Dom", funk de versos ousados. "Não posso falar que todo mundo na escola adora", conta.
"Dom, dom, dom, dom, dom, dom, dom/ A novinha experiente já nasceu com esse dom/ Dom, dom dom, dom, dom, dom, dom/ Ajoelha, se prepara e faz um bo***** bom", canta. As inspirações para compor funk pesadão, explica Pedrinho de forma não muito específica, teriam vindo "da rua".
"Na rua, eu ouvia funk e ficava pegando o ritmo, tentava encaixar palavra com palavra. Comecei a fazer ostentação, ouvia muito funk picante na rua e ficava fazendo sozinho. Do nada saiu e mostrei para o meu irmão", resume sobre a composição de "Dom Dom Dom", que ganhou uma versão "light" com letra mais branda para facilitar o uso comercial fora dos bailes.
"Putaria poética"
Um dos MCs preferidos de Pedrinho é o MC Livinho, 19 anos, também morador da zona norte de São Paulo. Livinho é autor de canções de funk pesadão como "Pepeca do Mal" e "Mulher Kama Sutra" e afirma ser um dos pioneiros da "putaria poética", como ele mesmo define, entre os MCs de São Paulo.
"Lá vem ela corrigir o meu bilau", canta o MC em um dos poucos trechos mais "leves". Nas gravações, Livinho demonstra certa preocupação em não apenas "dar a letra", mas também soar afinado. "Introduzi mais melodia ao funk, faltava um pouco disso no vocal."
"Funk com palavras mais abertas aqui em São Paulo ainda não tinha", afirma Livinho. "O que me diferenciou foi juntar o ritmo (do funk paulista) a essas letras de 'funk putaria', mas é uma 'putaria poética'. Sou evangélico", completa o MC, que se musicalizou na igreja e começou a compor funks da linhagem ostentação.
Livinho conta que gosta de ler e cita Cecília Meireles e Casimiro de Abreu como alguns de seus autores favoritos. "Comecei a buscar mais conhecimento. Vi que as pessoas gostam de um diferencial na letra". Em suas pesquisas, concluiu que "'bilau' e 'pepeca' são palavras que poucas pessoas falam, é mais para criança".
Com a vontade de se diferenciar, MC Livinho escreve letras pesadas com "frases poéticas para dar diversidade", nas quais imperam o duplo sentido e não sobram traços de ingenuidade.
A reação feminina ao "pesadão"
As letras podem ser ofensivas às mulheres, e os MCs entrevistados demonstram ter noção disso. "Tem menina que fala que a letra é forte, isso é normal. O 'funk da putaria' é para mulheres que dançam e fazem o que diz na música. Tem menina que gosta de ouvir porque acha que tem mulher que é assim (como nas letras)", diz MC Livinho.
MC Brisola, 21 anos, morador da Vila Nova Galvão, também em São Paulo, faz funk desde os 16 e optou por parar de cantar proibidão carioca para fazer "música sensual". "A gente grava a versão proibida, que é o que o pessoal gosta, e outra versão light para as rádios", explica o funkeiro autor de "Valsa da Putaria" e "Baile da Sacanagem".
"No baile funk, quando as pessoas se gostam é mais fácil de levar para a cama do que em outros ritmos", opina Brisola. "Muita novinha hoje está terrível, se ela quer fazer sexo com você ela fala 'vamos' e pronto."
MC Brisola, escrito com um "s" que o diferencia do ex-político Leonel Brizola, acredita que a maioria de seu público feminino não leva o conteúdo "sensual" como "ofensa". "Tem menina que fala que as letras xingam as mulheres, mas essas são poucas. A maioria gosta das letras pesadas".
Futuro do funk
Quanto aos próximos contornos do funk paulista - que já experimentou letras politizadas e de ostentação -, MC Livinho acha "difícil que o funk se altere muito, mas pode haver mudança de estilo, letra, melodia sem perder as origens do batidão".
"Antes (as pessoas) achavam que funk era de favelado, que quem ouve é bandido", analisa MC Brisola. "O Guimê foi na TV e mostrou que é diferente. Acho que o funk deveria ficar igual ao pagode, igual música pop, e não sair nunca mais. O funk chegou para ficar".